quarta-feira, 2 de abril de 2008

Da máquina do tempo (ou da mudança de assunto)

Descobri ontem que estou ficando velha.
Essa descoberta tão frustrante para uma jovem de 23 anos foi feita após "viajar" para um lugar distante, mais exatamente Vargem Grande, mais exatamente porque o namorado trabalha lá (uma das 4 escolas onde ele dá aulas...).Ah, também descobri que Vargem Grande é realmente muito longe e que o 747 é realmente muito medonho, mas essas descobertas são de conhecimento público; o lance é que quando a gente descobre que estamos envelhecendo a gente pára pra pensar muito mais na nossa vida, o que foi dela e o que vai ser de agora em diante.
As primeiras crianças saiam da sala de aula e, aos poucos, a pequena quadra na frente da escola foi enchendo de miniaturinhas engraçadinhas de tranças na cabeça e rabinhos de cavalo.Meninos em meninas de uns seis ou sete anos corriam de um lado para o outro, por trás das traves de futebol, por entre as colunas de ferro, subindo nas elevações das paredes.Alguns correndo, brincando de pique, outras penteando os cabelos da coleguinha, muita gritaria.
No meio desse cenário tão "comercial de margarina" meus olhos encontraram uma figurinha interessante: ela tinha os cabelos bem compridos, castanhos claro, usava sainha amarela e camiseta com o nome da escola, tinha uma enorme trança no alto da cabeça e uma parte dos cabelos soltos.Era bochechuda, mas não gordinha, parecia ter seis anos e olhos castanhos como o cabelo.Ela tentara sem sucesso se enturmar com as três meninas que brincavam de "imite o mestre" quando resolveu fazer o que aparentemente mais gostava: uniu-se a um menino gorducho, um de cabelos lisos e olhos puxados e a um outro com cara de levado para brincar de Naruto.
Foi como voltar aos tempos de INSA.
Foi como ver aquela quantidade de cabelos negros correndo pelo pátio na frustrante tentativa frustrada de brincar com as meninas ridiculamente pequenas da escola.Para a dona da cabeleira, tudo poderia ser tão grande e as pessoas eram tão pequenas...ela sempre acabava indo para onde os meninos jogavam bola e apostavam corridas, sendo a única menina a correr com eles e a única a chutar a bola com devida perfeição.Sentia-se mais a vontade assim do que levando sua boneca para brincar na escola...
...mais ainda do que ficar sentada num canto com seu sanduíche solitária nos seus grandes pensamentos de menina, tal qual a criancinha sentada com as costas na trave de futebol.Ela era tão grade como eu, tão bochechuda como eu e tinha os cabelos tão negros quantos os meus.Eu sabia como aquilo era estranho, como tentar, desde pequena, a ser aceita, mesmo sendo um pouco diferente.Destoávamos das demais por sermos grandes e desenvolvidas, poderia chutar que ela já podia usar sutiãns, assim como eu comecei tão cedo a usá-los.Mas eu sabia que ela ia crescer e se tornar uma bela mulher, como eu não saberia que seria assim comigo.Era como se ela fosse eu e eu fosse ela, quando me senti cada vez mais confusa, pois na verdade era eu ali, sentada com as costas na trave e era ela sentada me assistindo...
E voltei a si quando ganhei um beijo e acordei daquele tamanho devaneio.Era eu a ve-la, era ela a levantar-se da trave e juntar-se à professora para mais duas horas de aula de português.Como queria chegar perto dela, como eu queria dizer-lhe que tudo aquilo era temporário, que em breve ela sentiria-se tão normal como seus amigos...Fui pega pela mão, Michel queria ir embora.E eu atravessei a porta da escola sem tirar a menina da cabeça, as duas eu que eu havia reencontrado, a eu amiga dos meninos, a eu sentada na trave.
E foi assim que senti-me velha, pois eu já descobri que tudo que passei era apenas uma fase frustrante de criança, quando você é diferente e rejeitada pelos demais.Aos nove anos eu não imaginava que seria igual aos outros um dia e hoje me sinto tão igual e tão comum que acabo tentando ser diferente pra ter algum destaque semelhante ao de antes para mim.A introspecção deu lugar a uma breve popularidade, e percebi que u tempo passou.
Não reclamo do tempo que passa, apenas agradeço, até as primeiras rugas aparecerem.

Um comentário:

  1. ás vezes, até hoje, sinto me como a menina sentada na trave...

    será que um dia muda?!
    Bjão!

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