sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Restaurar uma vida II

E o Catete vem me trazendo grandes inspirações ultimamente.

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Sendo professora, eu aprendo mais do que ensino. Aprendo novas linguagens, novas histórias, novas vidas. O lado bom de ser professora é poder curtir esse momento de aprendizado. Via de mão dupla; e isso é muito gostoso. Gosto de ouvir histórias de alunos. Com tão pouca idade, eles têm muito o que me contar. Ela teve uma aluna recém saída da depressão no fim do ano passado, e ela ficou admirada com a força dela. Menina forte. Com 14 anos, tomava remédios para se controlar. Tentou se matar, agora não me lembro de quê.

Em mais uma das minhas idas ao Catete, enquanto esperava com a mãe e a avó a porta ser aberta pela minha aluna, nem percebi que a demora poderia ser um indício de algo. A avó apertou a campainha e ficamos de papo na porta. Num momento de grande desespero, mãe e avó se olharam, com aquele olhar que só quem entende sabe o que pode ter acontecido.

Conheci bem esse olhar por conta dela. Ah, ela mais uma vez. Ela que montou toda essa vida pra mim. Ela, que também passou por isso. Admirável, talvez. É difícil vencer a si mesmo, a tentação de destruir a própria vida. Juro, eu não teria coragem.

A avó apertou com mais urgencia a campainha. Desespero. Logo fiquei assutada; na verdade, já estava, pois sabia do que se tratava. Fiquei com muito receio de ver coisas que poderia não querer ver.

Ontem fui lá outra vez, para mais um texto, mais uma aula. Quando já ia embora, perguntei a ela onde ficava o banco e ela disse que perguntaria a avó. Fiquei no corredor da sua casa, esperando a menina perguntar a avó onde ficava o banco. O que me chamou a atenção foi uma foto muito bonita de uma enérgica garota loira e alta. Os dentes saltavam dos lábios, parecia feliz, pelo menos na foto. Por um instante, me perguntei quem era aquela garota na foto, tão cheia de vida e animada, bem vestida num vestido preto. Quando avistei minha aluna no fundo do corredor, com os cabelos desgrunhados e olheiras fundas, logo identifiquei.

A tristeza nos impede de restaurar uma vida. Mesmo triste, mesmo esquecida por si, ela tenta e isso é notável. Consigo ver nela a força de mudar, de voltar a acompanhar o mundo. Tenho muita vontade de perguntá-la o que a deixou assim. Gosto de ouvir histórias.

Pois espero que a aluna também goste de ouvir as minhas histórias dela.

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Você leu, gostou, mas não quer comentar aqui? Tá, td bem, me manda um e-mail: patriciateixeiramonteiro@gmail.com

P.S.: pessoa que quer me fazer uma surpresa, me mande um e-mail, ainda espero...

Um comentário:

  1. A nossa profissão nos permite cada coisa, né? Realmente, a gente aprende taaaanto.
    Quanto à tristeza, à perda do sorriso,nossa, q complicado! Minha receita é sempre: dê um sorriso que vc recebe outro de volta; dê um abraço que vc recebe ouutro de volta. Às, vezes, são as duas melhores coisas q podemos fazer por alguém: sorrir e abraçar.
    E juro que gosto da maneira como vc fala das pessoas, tão humana!
    Bjos

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